Classificação: 4 Estrelas
Quando saiu este livro, senti-me atraída para ele. Foi o título que me agarrou e transportou a minha mente para diferentes cenários possíveis, mas em todos eles havia uma bonita história de amor por trás. Então, aproveitei a generosidade da Coolbooks no dia Mundial no Livro e usei o código de oferta para pedir este livro. E ainda bem que o fiz...
As últimas linhas destas mãos é uma história de amor roubada pelo tempo. Uma história de amor narrada no presente, com os fantasmas do passado a reclamar atenção. O amor desta história é corrosivo e, como o tempo desgastou Alice, deixando-a vazia de emoções positivas. Toda ela foi terreno fértil para a tristeza e isso abriu caminho a dores e frustrações naqueles que habitavam o mundo dela. E tudo chega até nós, leitores, pelas mãos de Alice em cartas que espelham amor e dor, esperança e desespero; e pelas palavras daqueles a quem o amor corrosivo contaminou e minou, os filhos Teresa, Henrique e Sebastião, a irmã Cristina e o ex-marido Sebastião. Todos eles trazem um visão de Alice e da dor que a ausência emocional dela deixou.
Foi tão simples sentir as dores, as frustrações, o desespero na ânsia de tirar Alice do poço onde se meteu. E esta facilidade de apropriar dos sentimentos destas personagens advém da escrita. É uma escrita poética, daquelas que nos embala e nos faz perder a noção do tempo. A Susana soube costurar as palavras, um verdadeiro trabalho de alta-costura. E nas palavras que tecia e juntava, soube criar um trabalho final com descrições que nos transportam para os locais e para os momentos. Senti os cheiros a canela e alfazema. Senti a leveza da brisa de verão que imiscuiu na saia de Alice enquanto ela dançava, feliz, com o amor que lhe deu luz e, no instante seguinte, lha roubou. Ouvia o desespero silencioso de Teresa que tentava, a todo o custo, acender de novo a luz interior da mãe. Mas, teve de baixar os braços dessa tarefa e usá-los para aconchegar os irmão, carentes de afeto e imersos numa incompreensão perante as fragilidades da mãe.
Também temos segredos que minam relações e que põem à prova as ligações entre as pessoas. A mensagem que autora consegue passar acerca do impacto dos segredos naqueles que os partilham está, também, muito bem conseguido. Fez-me desejar quebrar as mordaças que calavam as pessoas para que determinadas personagens se pudessem libertar das dores, das angústias e dos silêncios ruidosos que começaram a fazer parte da família.
Houve apenas dois aspetos que me deixaram insatisfeita: dos diálogos e o final. Relativamente aos diálogos falta-lhe a expressividade que tão bem sobressai ao longo da narrativa. São rápidos e sem aquelas descrições que oferece aos diálogos aquele tipo de dimensionalidade que os torna, aos meus olhos, reais. O final, demasiado apressado, não deixou espaço para que as emoções se transformassem perante os meus olhos. As personagens precisavam de tempo e de espaço para partilhar os sentimentos que as verdades deixaram a descoberto. E eu precisava de os sentir, de os ver e de um olhar final sobre a vida destas personagens. Teresa fechou parte da história, mas do meu ponto de vista foi parca nas palavras.
Apesar destes dois aspetos gostei muito de ler este livro. Sem dúvida que a Susana Amaro Velho vai ficar debaixo do meu olho. Estarei atenta a novas publicações. Temos aqui alguém que consegue dar corpo a uma história simples e coesa, com uma premissa já tantas vezes usada, através de uma escrita elegante e encantadora. Acho que, dificilmente vou esquecer a beleza impressa em muitas das frases deste livro. Perdi a conta à quantidade de citações que retirei do livro, e tenho dificuldade em eleger aquele que mais tocou o meu coração.