Palavras Memoráveis
Toda a gente se lembraria de Peter devido a dezanove minutos da sua vida, mas então e os outros nove milhões? Lacy teria de ser a guardiã deles, porque essa era a única maneira de aquela parte de Peter se manter viva. Por cada lembrança dele que envolvesse uma bala ou um grito, ela teria outras cem: de um rapazinho a chapinhar num lago, ou a andar de bicicleta pela primeira vez, ou a acenar de cima de uma estrutura de ferro num parque infantil. De um beijo de boa-noite, ou de um cartão do Dia da Mãe pintado com lápis de cera, ou de uma voz desafinada no duche. Ia juntá-los a todos - os momentos em que o filho tinha sido igual aos filhos das outras pessoas. Ia exibi-los, como pérolas preciosas, todos os dias da sua vida; porque se os perdesse, então o rapaz que ela tinha amado, criado e conhecido desapareceria realmente.
Jodi Picoult, Dezanove Minutos
***
Quando começou a ser difícil respirar, mergulhou num sonho. Ainda tinha 18 anos, mas era o seu primeiro dia no jardim-infantil. Levava a sua mochila e lancheira do Super-Homem. A camioneta cor-de-laranja da escola tinha parado, com um suspiro, escancarando as mandíbulas. Peter subiu os degraus e ficou virado para a traseira da camioneta, mas desta vez, era o único aluno que lá estava. Percorreu o corredor até ao fim, perto da saída de emergência. Colocou a lancheira ao seu lado e olhou pelo vidro de trás. Havia tanta luz que pensou que o próprio sol devia estar a segui-lo pela estrada.
- Estamos quase a chegar - disse uma voz, e Peter virou-se para olhar para o condutor. Mas tal como não havia passageiros, também não estava ninguém ao volante.
Eis o mais espantoso do seu sonho: no seu sonho, Peter não tinha medo. Sabia que, de alguma forma, ia precisamente para onde desejava ir.
Jodi Picoult, Dezanove Minutos