Há um aspeto que eu aprecio muito nos livros de Jodi Picoult que é a sua capacidade de criar personagens muito humanizadas e com muitas dimensões interiores. Não consigo categorizas as personagens em boas ou más, porque todas elas têm comportamentos que podem ser classificados de bons e de menos bons. Esta forma de construir personagens está muito bem ilustrado através das personagens que figuram neste livro.
Esta leitura também foi uma forma de constatar que os livros da Jodi Picoult são bons para acabar com a minha falta de vontade de ler. Andava a ler muito pouco. Simplesmente não me apetecia ler e tinha dificuldade em me entregar às histórias. Assim que comecei a ler este, os sentimentos adversos fugiram e agarrei-me à leitura com unhas e dentes.
Uma Verdade Simples mostra-nos o quotidiano de uma comunidade amish. Eu não fazia ideia da existência desta comunidade nem das suas características. Ao longo destas páginas (e com alguma pesquisa adicional) fiquei a conhecer quais os princípios que regem o comportamento dos elementos desta comunidade. É uma comunidade com as suas particularidades e ao longo do livro é interessante conhecê-las e refletir sobre o impacto destas nos comportamentos e vivências das personagens.
Katie é a personagem que mexe com as engrenagens da história. Não foi difícil sentir empatia por esta jovem que se vê presa em dois mundos e apesar da sua lealdade em relação a um deles, foi incapaz de resistir ao sentimento inebriante que só a sensação de liberdade nos pode oferecer.
Apesar da vida de Katie apresentar imensas mudanças, ela será a alavanca que impulsionará mudanças na vida de Elli.
Elli é a advogada que aparece para defender Katie. É engraçado assistir à relação que as duas vão construindo e de que forma os desejos opostos de cada uma servem para curar as feridas que cada uma guarda na alma.
E no meio de todos os silêncios, de muitas das coisas que não foram ditas surge Coop. Como gostei deste homem e da forma como ele e Elli se encaixavam. São daquelas personagens literárias que gostei de conhecer e que eu gostava que existissem na realidade.
Ao longo de muitos avanços e recuos há coisas importantes que sobressaem e que se intrometeram nas minhas reflexões. Até que ponto é que limitarmos ou condicionarmos as nossas vidas em função de uma cultura nos impede de crescer enquanto pessoas? Até que ponto é que essa mesma cultura nos pode afastar daqueles que amamos? E a pressão social do grupo? Como é que essa pressão nos molda e nos formata enquanto pessoas?
Mas por outro lado, quão importante é abrandar e prestar atenção às coisas mais simples da vida? Quão importante é sentir que pertencemos a um espaço, a uma comunidade onde nos sintamos amados(as)?
E é aqui que reside a magia de Jodi Picoult, ou seja, a sua capacidade de nos fazer gostar e não gostar das situações e das personagens. Fui confrontada com diferentes pontos de vista e tudo está encaixado de forma a me fazer pensar sobre eles. Isto para mim é magnífico e torna um livro muito especial.
E depois um final que foi capaz de me deixar sem palavras e me deixou a pensar. Afinal, se eu fosse a Elli o que faria? Tomava a mesma decisão dela ou outra? Ainda hoje, passadas três semanas do fim da leitura, não tenho uma resposta concreta para algo que, considerando os diferentes pontos de vista, tem múltiplas formas de ser resolvido.
Jodi Picoult tem uma forma muito especial de construir as suas narrativas. Para além de todo o cuidado na construção e em delinear os acontecimentos de forma coerente, a autora desenvolve um grande trabalho de investigação acerca da temática que pretende abordar bem como na forma como decide construir as personagens que dão corpo a esta história.
Em Frágil conhecemos Willow, um menina muito especial que sofre de osteogénese imperfeita (doença dos ossos de vidro) e assistimos ao impacto desta doença e da decisão da mãe em processar Piper, a sua obstetra e melhor amiga, relativamente ao diagnóstico da pequena Willow.
As personagens que compõem a narrativa são bastante complexas, onde facilmente identificamos características que as tornam muito humanas. As minhas impressões em relação a Charlotte e Sean (mãe e pai da Willow) oscilaram um pouco ao longo do livro. Willow, Amelia e Piper sempre as olhei de forma positiva, ou seja, gostei delas logo nas primeiras páginas e esse sentimento manteve-se até ao fim do livro. No final, também Charlotte e Sean me conquistaram. Apesar de não concordas com muitos dos comportamentos da Charlotte, no fim conseguir compreender tudo aquilo que ela fez. Ela era, também, uma pessoa que precisava de muito apoio.
A forma como a doença interfere nas dinâmicas e comunicações familiares está descrita de uma forma muito realista e que se coaduna com aquilo que a investigação na área indica acerca do impacto de uma doença na família e nos cuidadores.
Uma das pessoas que mais sofre ao longo de todo este processo é Amelia. Uma jovem que adora a irmã, mas que está envolta num véu de insegurança, receios e de uma dor emocional que se transforma em bulimia e comportamento autolesivos. Sofri por esta jovem, a única coisa que achei estranha foi que, perante tantos sinais de alerta, esta miúda passar despercebia aos professores e a outras pessoas que passam tempo suficiente com ela para perceber que o seu estado emocional tinha levado uma facada.
Willow, para mim, significa a doçura, a leveza de uma pena que voa, sem destino ao vento. É uma miúda impressionante que nos mostra uma forma especial de lidar com uma doença muito limitante. Há uma passagem no livro em que ela, a mãe e a irmã vão a um encontro de pessoa com osteogénese. Foi aconhegante perceber o quanto Willow e Amelia conquistar naqueles dias e o quanto lhes fez bem. Charlotte é que teve a sua vida mais complicada, porém foi importante para fazê-la pensar.
O final é agridoce e ao estilo da autora. Eu percebi o que aconteceu, mas não concordo com a forma como aconteceu. Dado todo o contexto em torno da situação não faz muito sentido como as coisas culminaram. Infelizmente não posso ser muito mais específica, caso contrário oferecia-vos um grande spoiler e não seria nada agradável.
Para terminar, quero agradecer as meninas com quem fiz a leitura conjunta. Foi muito bom poder trocar ideias com vocês e ter acesso a outros pontos de vista. Espero participar numa outra leitura ao longo do projeto Um ano com a Jodi.
Autor: Jodi Picoult Ano: 2009 Editora: Civilização Editora Número de páginas: 440 páginas Classificação: 3 Estrelas
Sinopse
Há dezoito anos que os Harte e os Gold vivem lado a lado, partilhando tudo, desde comida chinesa e varicela até irem buscar os filhos uns dos outros à vez. Quer os pais quer os filhos são melhores amigos, por isso, não é nenhuma surpresa quando a amizade entre Chris e Emily se transforma em algo mais na altura do liceu. Tornaram-se almas gémeas no momento em que Emily nasceu. Quando ligam do hospital por volta da meia-noite, ninguém está preparado para a verdade terrível: Emily, com apenas dezassete anos, está morta devido a um tiro na cabeça, aparentemente resultado de um pacto suicida. A arma contém uma bala que Chris diz à polícia estar-lhe destinada, mas uma detective local tem dúvidas. Os Harte e os Gold, num único momento aterrador, têm de encarar o pior medo de um pai: será que conhecemos mesmo os nossos filhos?
Opinião
O que é que somos capazes de fazer pela pessoa que amamos? Até que ponto estamos dispostos a ir só para acabar com o sofrimento de uma das pessoas mais importantes para nós? Estas são apenas duas das inúmeras perguntas que Chris se deve ter colocado a si próprio quando se deparou com as ideias suicidas de Emily e com o seu pedido.
O Pacto é um livro com uma componente psicológica muito forte, que nos leva por uma viagem ao mundo interior dos adolescentes. Não é uma leitura leve nem fácil... Facilmente somos invadidos por questões e dúvidas.
É apenas o segundo livro que leio da autora, mas a forma como ela aborda os assuntos neste livro é bastantes menos bem conseguida do que no livro anterior que li, Dezanove Minutos. Porque é que eu digo que foi menos bem conseguido? Bem, isto deve-se a algumas falhas e incoerências. Primeiro, há uma falha em termos das idades de Chris e Emily que por si só fazia com que parte da narrativa deixasse de ter sentido. Chris nasceu no dia 24 de Novembro e a Emily nasceu no dia 7 de Maio do ano seguinte. No julgamento é referido que eles têm três meses de diferença, o que é errado. E o que mais condiciona é que ao longo do livro é referido que Chris e Emily frequentavam o mesmo ano escolar, o que só seria possível se Chris tivesse reprovado algum ano, o que pelas descrições que são feitas dele é impossível isso ter acontecido.
Emily era uma adolescente em sofrimento e emocionalmente dependente de Chris, a pessoa com quem partilhou grande parte do seu tempo desde a infância. Não é difícil compreender o sofrimento de Emily, mas a história carece de uma maior exposição dos acontecimentos da sua vida para compreendermos melhor a necessidade que ela tem de se suicidar.
[INÍCIO SPOILER]
Um dos aspectos que vai limitar a vida de Emily e arrastá-la para o mundo cinzento da depressão é um abuso sexual que ela vai sofrer aos 9 anos na casa de banho de um MacDonalds. O que para mim se tornou irreal e pouco credível foi que ninguém se apercebeu de nada. Emily era uma miúda sensível e que dificilmente escondia aquilo que sentia. Por isso, de certeza que ela viria suficientemente perturbada para que os adultos que estavam com ela, Gus e James (pais de Chris) se apercebessem de que algo não estava bem.
É óbvio que este aspecto, conjugado com a dualidade que Emily sentia em relação a Chris (olhava para ele como namorado e como irmão) a condicionava na exploração sexual. Aqui também senti um pouco que as as coisas não conjugam muito bem. Chris nunca se apercebeu muito bem deste desconforto de Emily e assumiu uma posição um pouco egoísta, algo que não bate muito certo com a dimensão psicológica que ficamos a conhecer de Chris ao longo do livro.
[FIM SPOILER]
Gostei de ver a dedicação de Chris a Emily. Acredito que ele gostasse verdadeiramente dela, mas até eu fico confusa naquilo que hei-de pensar acerca dele perante determinadas atitudes. Mas dá para perceber a forte ligação que existe entre os dois.
Uma parte que achei muito bem conseguida foi o julgamento de Chris. Parece muito real!!! Com os advogados a agirem de uma forma que quase nos sentimos dentro do tribunal a presenciar tudo.
O desfecho de toda a história e a forma como decorrer o suicídio de Emily foi diferente daquilo que eu inicialmente imaginei. Decididamente, fui bastante surpreendida com esta conclusão dos acontecimentos.
Apesar de ter sido surpreendida, as incongruências e a pouca exploração do passado dos dois adolescentes (aspecto muito importante para a compreensão de tudo) não me deixa classificar este livro com mais de três estrelas. Até o considero ligeiramente abaixo das três estrelas, mas como gosto de dar valores arredondados, decidi-me que está mais perto das três estrelas do que das duas.
Em Sterling, New Hampshire, Peter Houghton, um estudante de liceu com dezassete anos, suportou anos de abuso verbal e físico por parte dos colegas. A sua amiga Josie Cormier, sucumbiu à pressão dos colegas e agora dá-se com os grupos mais populares que muitas vezes instigam o assédio. Um incidente de perseguição é a gota de água para Peter, levando-o a cometer um acto de violência que mudará para sempre a vida dos residentes de Sterling.
Opinião
Quando iniciei a leitura deste livro estava longe de imaginar aquilo que eu ali iria encontrar. Acreditem, a sinopse é extremamente reduzida quando comparada com a complexidade que Jodi Picoult nos presentei ao longo destas páginas.
Dezanove Minutos é um livro que deixa as emoções à flor da pele que retracta um acontecimento que, muito recentemente, aconteceu nos EUA (o massacre numa escola). Aliada a esta memória recente, surgem aspectos como a enorme capacidade de descrever os acontecimentos, a complexidade psicológica das personagens envolvidas, o enredo fantasticamente bem construído tornando o livro uma "bomba atómica" de emoções que nos prendem até à ultima página... Posso dizer que à medida que vão lendo serão sempre surpreendidos e não existem "pontos mortos" no livro. É simplesmente viciante e difícil de largar.
Peter é um jovem que nunca soube o que é ser admirado na escola... Sempre foi uma alvo fácil à intimidação e à agressão. Se até ao sexto ano tinha o apoio incondicional da sua amiga Josie tornava as coisas mais suportáveis, a separação de ambos tornou a vida de Peter muito mais difícil. Apesar da crueldade do acto de Peter consegui sentir empatia por ele e pena, frequentemente fiquei emocionada com as intimidações que ele ia sofrendo. Era um miúdo sensível e diferente dos outros, mas a pressão a que foi sujeito foi-se acumulando dentro dele culminando num acto condenável e macabro. Sentia-se incompreendido por todos, até pelos próprios pais.
Josie foi aquele que mais sofreu mudanças ao longo que a narrativa se desenvolvida e foi também a personagem que mais me fez pensar, proporcionando-me diferentes experiências emocionais. Havia momentos em que sentia pena dela, outros em que admirava aquilo que ela fazia, havia ainda outros que me irritava profundamente e outros em que me sentia completamente desesperada por não poder fazer nada contra as atitudes e passividade dela perante determinadas situações. Josie aprendeu a usar uma máscara para poder sobreviver no seu meio escolar. Assim, a maquilhagem proporcionou-lhe a criação de uma Josie popular, adorada por muitos. Rendeu-se às miúdas de personalidade consumista e oca, mas no fundo havia outra Josie, completamente diferentes e a quilómetros de distância de atitudes mesquinhas, materialistas e sem inteligência. Na minha opinião, esta incongruência entre aquilo que ela era e aquilo que ela se mostrava aos outros causava-lhe um enorme sofrimento. Depois havia o Matt, o namorado de Josie, que simplesmente me fazia revirar os olhos de tão estúpido que era. Pelas descrições imaginei-o como sendo um grande monte de músculos sem o mínimo de inteligência. Odiava a forma como ele tratava Peter e como pressionava psicologicamente a Josie.
Há uma passagem do livro que retrata a Josie no seu mais profundo ser. É a seguinte:
Se passarmos a vida concentrados naquilo que os outros pensam de nós, será que nos esquecemos de quem realmente somos? E se o rosto que mostramos ao mundo for uma máscara... sem nada por baixo?
O final de Peter é um bocadinho previsível. Confesso que até pensei que tal acontecimento iria acontecer mais cedo. Os pais de Peter, Lucy e Lewis, também me fizerem ter os sentimentos à flor da pele. Viveram um sofrimento atroz... Aliás eles foram a prova viva de que quando a vida começa a andar para trás não há maneira de se conseguir dar a volta por cima. É muito interessante ver as reacções deles, muito bem construídas e descritas pela escritora que deixam qualquer pessoa a pensar.
Quero destacar um aspecto muito interessante do livro (e não sei se faz parte do género de escrita adoptado pela escritora), e do qual gostei muito, que é o facto de a autora ir deixando um conjunto de perguntas retóricas que activam o pensamento do leitor. São fantásticas, surgindo no momento certo que fazem com que o nosso pensamento mergulhe num mar profundo e cheio de "ses".
É um livro fantástico e marcante... Acho que é um livro que me vai acompanhar ao longo de vários dias! É emocionalmente intenso.